As mudanças climáticas, os sistemas alimentares e a segurança alimentar e nutricional: próximo a um ponto sem volta.
Eduardo Nilson, Denise Oliveira e Silva, Erica Ell, Juliana Ubarana
Resumo
Nesse informe, refletiremos sobre o Relatório do Estado do Clima Global 2023 e o Dia Mundial da Água, bem como a sua relação com os sistemas alimentares e a segurança alimentar e nutricional no mundo, incluindo as respostas propostas pela FAO aos desafios atuais.
As interfaces entre as mudanças climáticas, os sistemas alimentares e a segurança alimentar e nutricional (SAN) têm se destacado nos debates da agenda de desenvolvimento sustentável desde o início da década de 1990. A interseção desses temas tem sido evidenciada em um grande conjunto de estudos demonstram que as mudanças climáticas possuem efeitos negativos na SAN, potencializados pela pobreza e desigualdade social, bem como o papel dos sistemas alimentares como causas e como sua transformação pode reverter a situação atual.
No campo da SAN, as mudanças climáticas impactam principalmente na produção e acesso aos alimentos, além de interferir na sua qualidade nutricional e de contribuir fortemente na volatilidade dos preços. Os estudos também apontam estratégias de mitigação e adaptação aos efeitos das mudanças climáticas para mitigar e reverter seus efeitos sobre a SAN, particularmente considerando o maior impacto sobre as populações mais vulneráveis, em função das desigualdades sociais e da pobreza, reforçando a necessidade de maior investimento em políticas públicas, estudos e pesquisas acerca da temática no mundo. (Alpino et al., 2022).
Essas interfaces são ainda mais notáveis quando se considera a questão da sindemia global de desnutrição, obesidade e mudanças climáticas, que evidencia o papel central dos sistemas alimentares hegemônicos, baseados nas monoculturas e nos produtos ultraprocessados, como um dos principais agentes causadores das mudanças climáticas e como determinantes da dupla carga da má nutrição (Swinburn et al., 2019).
Vale ainda a pena destacar o papel da água diante das mudanças climáticas, da SAN e dos sistemas alimentares, no contexto do Dia Mundial da Água, celebrado em 22 de março. A água é um direito humano, mas tem sido ameaçada de privatização mesmo sendo um alimento e essencial para a produção e preparação de alimentos e tem sido ameaçada pelo uso insustentável e pelo estresse hídrico provocado pelas mudanças climáticas, afetando mais severamente as populações mais vulneráveis.
Mudanças climáticas e a segurança alimentar e nutricional
Em 2019, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas trouxe em seu relatório uma análise detalhada dos efeitos das mudanças climáticas sobre a segurança alimentar e nutricional global (The Intergovernmental Panel on Climate Change, 2019).
Segundo o relatório, o atual sistema alimentar dominante, contemplando da produção, transporte, processamento e embalagem ao armazenamento, varejo, consumo, perdas e desperdícios, alimenta a grande maioria da população mundial e sustenta os meios de vida de mais de 1 bilhão de pessoas. Desde 1961, a oferta de alimentos per capita aumentou mais de 30%, acompanhado pelo maior uso de fertilizantes nitrogenados (aumento de cerca de 800%) e recursos hídricos para irrigação (que aumentou mais de 100%). No entanto, esse sistema alimentar é extremamente falho e desigual, na medida em que atualmente se estima que 821 milhões de pessoas estejam subnutridas e que 151 milhões de crianças menores de cinco anos sejam afetadas por retardo no crescimento, 613 milhões de mulheres e meninas entre 15 e 49 anos sofram de deficiência de ferro e 2 bilhões de adultos estejam com sobrepeso ou obesidade. Para agravar mais essa situação, o sistema alimentar dominante no mundo está sob pressão de estressores não climáticos (tais como o crescimento populacional e de renda e o aumento da demanda por produtos de origem animal) e das mudanças climáticas, que estão impactando fortemente os quatro pilares da segurança alimentar (disponibilidade, acesso, utilização e estabilidade).
Observa-se que as mudanças climáticas já estão afetando a segurança alimentar por meio do aumento das temperaturas, de alterações nos padrões de precipitação e da maior frequência de alguns eventos extremos. Estudos que separam as mudanças climáticas de outros fatores que afetam os rendimentos das colheitas mostraram que os rendimentos de algumas culturas (por exemplo, milho e trigo), principalmente em regiões de baixa latitude foram afetados negativamente pelas mudanças climáticas, enquanto em muitas regiões de alta latitude e que o aquecimento combinado com o aumento das secas causou grandes efeitos negativos nos rendimentos em partes do Mediterrâneo e estão afetando mais severamente a segurança alimentar em regiões áridas, especialmente na África, e em regiões de montanha da Ásia e América do Sul.
As projeções para o futuro não são animadoras, pois se projeta que a segurança alimentar será cada vez mais afetada pelas futuras mudanças climáticas projetadas, incluindo o aumento de preço dos cereais até 2050, o que afetaria os consumidores globalmente através de preços mais altos dos alimentos. Nesse sentido, os consumidores de baixa renda, em particular, estarão em maior risco, sendo estimado que poderão aumentar em até 183 milhões o total de pessoas em risco de fome em comparação com um cenário sem mudanças climáticas. Outra questão importante ligada às mudanças climática, a distribuição de pragas e doenças mudarão, pode afetar negativamente a produção em muitas regiões e, junto com a maior ocorrência de eventos extremos, deve aumentar o risco de interrupções no sistema alimentar.
Por exemplo, a vulnerabilidade dos sistemas pastoris às mudanças climáticas é muito alta. Segundo o relatório, o pastoreio é praticado em mais de 75% dos países por entre 200 e 500 milhões de pessoas, incluindo comunidades nômades, pastores transumantes e agropastores. Os impactos nos sistemas pastoris na África incluem menor produtividade de pastagens e de animais, a função reprodutiva danificada e a perda de biodiversidade. Essa vulnerabilidade dos sistemas pastoris é exacerbada por fatores não climáticos, tais como a posse da terra, a sedentarização, as mudanças em instituições tradicionais, as espécies invasoras, a falta de mercados e os conflitos.
Em outro campo, a produção de frutas e hortaliças, um componente-chave das dietas saudáveis, também é muito vulnerável às mudanças climáticas, sendo projetados declínios nos rendimentos e na adequação das culturas sob temperaturas mais altas, especialmente em regiões tropicais e semitropicais. O estresse térmico reduz a frutificação e acelera o desenvolvimento de vegetais anuais, resultando em perdas de produtividade e de qualidade do produto prejudicada e no aumento das perdas e desperdícios de alimentos. Por outro lado, estações de crescimento mais longas permitem o cultivo de um maior número de plantações e podem contribuir para maiores rendimentos anuais. No entanto, algumas frutas e hortaliças precisam de um período de acumulação de frio para produzir uma colheita viável, e invernos mais quentes podem constituir um importante risco para essas culturas.
Ainda segundo o relatório, a segurança alimentar e as mudanças climáticas têm fortes dimensões de gênero e equidade. Destaca, nesse sentido, que, em todo o mundo, as mulheres desempenham um papel fundamental na segurança alimentar e nutricional, embora existam diferenças regionais e os impactos das mudanças climáticas variam entre diversos grupos sociais, dependendo da idade, etnia, gênero, riqueza e classe. Extremos climáticos têm impactos imediatos e de longo prazo nos meios de vida de comunidades pobres e vulneráveis, contribuindo para maiores riscos de insegurança alimentar e nutricional que podem ser um multiplicador de estresse para a migração interna e externa. Portanto, é necessário empoderar as mulheres e implementar abordagens baseadas em direitos para permitir a criação de sinergias entre a segurança alimentar doméstica e a adaptação e a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas.
Para tanto, muitas práticas podem ser otimizadas e ampliadas para promover a adaptação em todo o sistema alimentar, tais como opções do lado da oferta incluindo o aumento da matéria orgânica do solo e controle da erosão, a melhoria do manejo de terras agrícolas, de pecuária e de pastagens, e melhorias genéticas para tolerância ao calor e à seca. A diversificação no sistema alimentar (como, por exemplo, a implementação de sistemas de produção integrados, de recursos genéticos amplos e de dietas heterogêneas) é uma estratégia-chave para reduzir os riscos. Além disso, são fundamentais adaptações do lado da demanda, como a adoção de dietas saudáveis e sustentáveis, em conjunto com a redução da perda e do desperdício de alimentos, para contribuir para a adaptação mediante a redução da área de terra adicional necessária para a produção de alimentos e das vulnerabilidades associadas do sistema alimentar. Nesse contexto, é importante considerar o conhecimento indígena e local, que pode trazer muitas contribuições para aumentar a resiliência dos sistemas alimentares.
O relatório também destaca os impactos dos sistemas alimentares hegemônicos sobre o clima, visto que aproximadamente de 21 a 37% das emissões totais de gases de efeito estufa (GEE) são atribuíveis a eles por conta da agricultura de larga escala e do uso da terra, bem como do armazenamento, transporte, embalagem, processamento, varejo e consumo dos alimentos. Por exemplo, somente na produção agrícola, estima-se que de 9 a 14% das emissões estejam associadas a atividades de cultivo e pecuária dentro das fazendas; 5 a 14% são relacionadas ao uso da terra, incluindo desmatamento e degradação de turfeiras e 5 a 10% são de atividades na cadeia de suprimentos. Sem intervenções nesses sistemas, as emissões provavelmente aumentarão cerca de 30 a 40% até 2050, devido ao aumento da demanda baseada no crescimento populacional e de renda e mudanças na dieta.
Práticas do lado da oferta podem contribuir para a mitigação das mudanças climáticas, reduzindo as emissões de culturas e pecuária, sequestrando carbono no solo e na biomassa e diminuindo a intensidade de emissões dentro de sistemas de produção sustentáveis. Opções com grande potencial de mitigação em sistemas de cultivo incluem sequestro de carbono no solo (com taxas decrescentes ao longo do tempo), reduções nas emissões de nitrogênio de fertilizantes, reduções nas emissões de metano do arroz irrigado e preenchimento de lacunas de rendimento. Opções com grande potencial de mitigação em sistemas de pecuária incluem melhor manejo de pastagens, com aumento da produção primária líquida e estoques de carbono no solo, manejo aprimorado de esterco e alimentação de maior qualidade.
O consumo de dietas saudáveis e sustentáveis apresenta grandes oportunidades para reduzir as emissões de gases de efeito estufa dos sistemas alimentares e melhorar os resultados sobre a saúde, considerando o consumo preferencial de grãos integrais, leguminosas, frutas, vegetais, nozes e sementes e com poucos alimentos de origem animal e limite em carboidratos. Com isso, poderiam ser obtidas reduções nas emissões de pecuária e sequestro de carbono no solo em terras poupadas. O potencial de mitigação da mudança dietética pode ser ainda maior, mas depende das escolhas dos consumidores e das preferências dietéticas guiadas por fatores sociais, culturais, ambientais e tradicionais, além do crescimento econômico.
Outro ponto relevante apontado pelo relatório é a redução da perda e desperdício de alimentos, visto que combinados correspondem a 25–30% do total de alimentos produzidos, equivalente a 8–10% das emissões antropogênicas totais de gases de efeito estufa e custos estimados de US$1 trilhão por ano. Opções técnicas para a redução da perda e desperdício de alimentos incluem técnicas de colheita aprimoradas, melhor armazenamento nas fazendas, e aprimoramento da infraestrutura e embalagem.
Dessa forma, a agricultura e os sistemas alimentares são fundamentais para as respostas globais às mudanças climáticas, combinando ações do lado da oferta, como produção eficiente, transporte e processamento, com intervenções do lado da demanda, incluindo a modificação das escolhas alimentares e redução da perda e desperdício de alimentos, reduz as emissões de GEE e melhora a resiliência do sistema alimentar. Essas medidas combinadas podem permitir a implementação de estratégias de adaptação e mitigação em larga escala baseadas em terra sem ameaçar a segurança alimentar e nutricional devido ao aumento da competição por terras para produção de alimentos e preços mais altos dos alimentos. Nesse sentido, são fundamentais transições justas, que tragam a combinação de medidas com a proteção a populações vulneráveis e pequenos agricultores.
Por fim, o relatório destaca a importância da governança das políticas e ações para a adaptação e mitigação em todo o sistema alimentar, em que condições facilitadoras podem incluir mecanismos de compartilhamento e transferência de riscos, como mercados de seguros e seguros meteorológicos baseados em índices, combinados a políticas de saúde pública para melhorar a nutrição (incluindo compras de alimentos para as escolas e campanhas educativas que podem potencialmente mudar a demanda, reduzir os custos com saúde e contribuir para emissões de gases de efeito estufa).
Esse diagnóstico do relatório e suas recomendações são corroborados por estudos recentes que discutem os graves riscos para a segurança alimentar e nutricional que estão ligados às mudanças climáticas, particularmente os extremos climáticos e meteorológicos no aquecimento global, seca, inundações e precipitação. Os riscos graves das mudanças climáticas para a segurança alimentar e nutricional são aqueles que resultam, com alta probabilidade, em insegurança alimentar e desnutrição generalizadas e persistentes para milhões de pessoas, têm o potencial de efeitos em cascata além dos sistemas alimentares, e contra os quais há capacidade limitada de prevenir ou responder completamente. Portanto, reforça-se a necessidade de opções de adaptação, incluindo ações de gestão institucional e governança, que podem ser tomadas para prevenir ou reduzir os riscos climáticos graves para a segurança alimentar e nutricional humana futura (Mirzabaev et al., 2023).
Relatório do Estado do Clima Global 2023
O Relatório do Estado do Clima Global 2023, lançado em março de 2024, confirma que 2023 foi o ano mais quente da história e traz outras mensagens alarmantes, como recordes de aumento da temperatura dos oceanos (junto com o aumento dos níveis dos mares, a perda de gelo no mar da Antártica e a retração das geleiras) e o aumento nos eventos climáticos extremos (e seu impacto negativo sobre o desenvolvimento socioeconômico). Ao mesmo tempo, traz mensagens de esperança como o potencial da transição para energias renováveis, enquanto destaca que o custo da inação em relação ao clima, ou seja, os prejuízos econômicos causados pelas mudanças climáticas, será muito maior do que o custo das ações para reverter as mudanças que estão em curso (World Meteorological Organization (WMO), 2024).
Mudanças no clima, medidas no relatório por indicadores-chave, podem ter impactos em cascata sobre o desenvolvimento nacional e no progresso em direção aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Por exemplo, alterações na acidez ou temperatura dos oceanos podem afetar a vida marinha potencialmente impactando comunidades costeiras que dependem da pesca local para seu sustento ou para a sua segurança alimentar e nutricional. Por outro lado, segundo o relatório, as ciências relacionadas ao clima desempenham um papel crítico em facilitar o desenvolvimento sustentável e, conforme demonstrado pelo relatório United in Science de 2023, essas ciências apoiam a realização de muitos dos ODS. Nesse sentido, reconhecer as interconexões entre o clima e o desenvolvimento pode, portanto, levar a ações sinérgicas, uma necessidade crescente à medida que o mundo se afasta cada vez mais da conquista tanto dos ODS quanto das metas do Acordo de Paris.
Dentre seus capítulos, o relatório aborda os impactos socioeconômicos das mudanças climáticas, destacando que a segurança alimentar, os deslocamentos populacionais e os impactos em populações vulneráveis continuam sendo uma preocupação crescente em 2023, agravados pelos riscos climáticos e meteorológicos em muitas partes do mundo.
Em 2023, condições climáticas extremas continuaram a desencadear deslocamentos novos, prolongados e secundários, aumentando a vulnerabilidade de populações já deslocadas por situações complexas e multifatoriais de conflitos e violência. Nesse sentido, o relatório reforça a necessidade de desenvolvimento e a implementação de estratégias locais de redução de riscos como a adoção do Quadro de Sendai para a Redução do Risco de Desastres, que inclui como componente essencial a existência de sistemas eficazes de alerta precoce para múltiplos riscos.
Esses eventos, combinados a outros fatores que ocorrem em um contexto mais amplo, de forma que os eventos climáticos extremos interagem e, em alguns casos, desencadeiam ou agravam situações relacionadas à segurança hídrica e à segurança alimentar e nutricional, junto com a mobilidade populacional e degradação ambiental, e afetam de forma desigual diferentes regiões do mundo.
O relatório também destaca que a atual crise global de alimentos e nutrição é a maior da história humana moderna, uma vez que o número de pessoas que enfrentam insegurança alimentar e nutricional aguda em todo o mundo mais que dobrou, passando de 149 milhões de pessoas antes da pandemia de COVID-19 para 333 milhões de pessoas em 2023 (em 78 países monitorados pelo Programa Mundial de Alimentos – PMA). Preocupantemente, os níveis globais de fome permaneceram inalterados de 2021 a 2022, e ainda estão muito acima dos níveis pré-pandêmicos: em 2022, 9,2% da população global (735,1 milhões de pessoas) estavam subnutridas, em comparação com 7,9% da população (612,8 milhões de pessoas), em 2019, e o número de pessoas sem condições de ter acesso a uma alimentação de qualidade é muitas vezes maior (FAO, IFAD, UNICEF, WFP, 2023).
Ainda segundo o relatório, temos como raízes desses altos níveis de insegurança alimentar e nutricional global os conflitos prolongados, recessões econômicas e altos preços dos alimentos, agravados pelos custos elevados dos insumos agrícolas devido a conflitos em andamento, aos quais se combinam os efeitos de extremos climáticos e meteorológicos. Por exemplo, no sul da África, extremos climáticos, incluindo a passagem do Ciclone Freddy em fevereiro de 2023, afetaram áreas de Madagascar, Moçambique, sul do Malawi e Zimbábue e as inundações associadas ao ciclone submergiram extensas áreas agrícolas e causaram danos severos às colheitas, exacerbando uma recuperação econômica lenta.
Globalmente, as perdas econômicas anuais devido a desastres relacionados ao clima e a fenômenos meteorológicos aumentaram muito desde os anos 2000. Por exemplo, entre 2007 e 2022, pesquisas de avaliação de necessidades pós-desastre realizadas em 60 países em todo o mundo mostraram que mais de 65% das perdas causadas por secas ocorreram no setor agrícola, incluindo perdas na produção de culturas e criação de gado. Além disso, no caso de inundações, tempestades e ciclones, cerca de 20% das perdas estão no setor agrícola.
Como mais um exemplo dos impactos mais severos das mudanças climáticas sobre o continente africano, no início de 2023, o Sudão do Sul continuou a enfrentar inundações excepcionais, com os níveis de água permanecendo altos mesmo durante a estação seca. Essas inundações prolongadas dificultaram o acesso das pessoas a necessidades básicas, como alimentos, água limpa e cuidados de saúde, e contribuíram para o colapso iminente dos meios de subsistência locais, de modo que foram estimadas, no primeiro semestre de 2023, cerca de 7,8 milhões de pessoas, equivalentes a quase dois terços da população total do Sudão do Sul, em situação de insegurança alimentar e nutricional grave (passando fome).
O relatório destacou igualmente o impacto do clima sobre regões mais vulneráveis da Ásia, como no Afeganistão, que enfrentou uma redução substancial no derretimento da neve e nas chuvas, resultando em outra safra de culturas precária. Isso agravou a situação de sua população, especialmente nas regiões norte e nordeste, sendo estimados, em 2023, 15,3 milhões de afegãos em situação de insegurança alimentar e nutricional grave. Também no Iêmen, 53% da população já estava em situação de insegurança alimentar e nutricional grave, agrava ainda mais por altos preços de alimentos e combustíveis, juntamente com inundações e conflitos prolongados. Na Indonésia, por sua vez, uma seca relacionada ao El Niño e outros fatores climáticos locais, afetou perto de 30% da área de cultivo de arroz, diminuindo a produção em 645.000 toneladas e atrasando as culturas no final de 2023.
O relatório destacou, ainda, a situação das Américas, em 2019, onde houve uma produção recorde de milho no Brasil que compensou as colheitas abaixo da média em outras partes da América do Sul devido a períodos prolongados de seca, especialmente na Argentina, onde as condições de seca provocaram uma diminuição de 15% na produção de cereais em comparação com a média de cinco anos. Além disso, o retorno do El Niño, em 2023, teve consequências adversas durante todo o ciclo de cultivo de milho na América Central e nas partes norte da América do Sul, onde déficits de água e altas temperaturas reduziram tanto a área de plantio quanto a produtividade, com impactos negativos na produção final, especialmente para os pequenos agricultores e famílias mais vulneráveis no Corredor Seco. Na estação seguinte, tempestades tropicais e eventos inesperados de chuvas intensas prejudicaram o crescimento normal das culturas em certas áreas próximas à costa do Pacífico da América Central.
A resposta da FAO
Em resposta ao relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), a FAO destacou que as mudanças climáticas aumentam e intensificam os riscos para a segurança alimentar dos países e populações mais vulneráveis (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), 2015). Dentre os principais riscos induzidos pelas mudanças climáticas identificados, a FAO destacou as consequências diretas para a segurança alimentar da perda de meios de subsistência e renda rural, da perda de ecossistemas marinhos e costeiros, da perda de ecossistemas terrestres e de água doce e da insegurança alimentar e nutricional e o colapso dos sistemas alimentares.
Segundo a FAO, os países e populações mais vulneráveis, incluindo áreas áridas e semiáridas, países sem litoral e pequenos estados insulares em desenvolvimento, são os mais impactados e os primeiros a serem afetados pelas mudanças climáticas. As mudanças climáticas também terão impactos mais amplos por meio dos efeitos sobre os fluxos comerciais, nos mercados de alimentos e na estabilidade de seus preços, podendo, ainda, introduzir novos riscos para a saúde humana. Portanto, são necessários esforços amplamente expandidos para responder às mudanças climáticas são necessários imediatamente para salvaguardar a capacidade dos sistemas alimentares de garantir a segurança alimentar e nutricional global (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), 2024).
A FAO reforçou também que existe uma necessidade urgente de transformar os sistemas agroalimentares e aproveitar suas soluções climáticas, pois os eventos climáticos extremos estão afetando progressivamente a segurança alimentar e nutricional e a agricultura, com implicações socioeconômicas mais amplas. Os impactos climáticos na alimentação e agricultura são crescentes, provocados por ondas de calor, inundações, secas, incêndios florestais e ciclones tropicais, perturbando a vida cotidiana de milhões e causando perdas econômicas de muitos bilhões de dólares e intensificando a pobreza de muitas populações em 2023. Destacam-se, ainda, vários fatores subjacentes que contribuem para a insegurança alimentar e nutricional, como conflitos prolongados, recessões econômicas, altos preços dos alimentos e impactos relacionados ao clima. Exemplos regionais ilustram ainda mais esses desafios, principalmente no continente africano.
Dentre as ações implementadas pela FAO diante desses desafios, foi destacada a prioridade ao aprimoramento da resiliência climática e à adaptação dentro do setor agroalimentar, sendo que a Organização também tem promovido a ação climática como uma oportunidade crucial para garantir que soluções agroalimentares estejam totalmente integradas à agenda ambiental e climática. A Estratégia da FAO sobre Mudanças Climáticas e seu Plano de Ação adotam uma abordagem abrangente, considerando diversos setores como produção de cultivos e pecuária, silvicultura, pesca e aquicultura, juntamente com cadeias de valor relacionadas, meios de subsistência, biodiversidade, água e ecossistemas, reconhecendo os papéis cruciais das mulheres, jovens e povos indígenas na promoção da mudança.
Segundo a FAO, essa estratégia é flexível, contemplando contextos diversos como áreas rurais, periurbanas e urbanas e buscando auxiliar os países a alinharem seus sistemas agroalimentares com seus compromissos e políticas climáticas nacionais. Além disso, a estratégia da FAO avalia diferentes riscos, incluindo as consequências da inação, riscos sistêmicos e riscos ambientais e adaptando as intervenções às necessidades específicas de populações vulneráveis e integrando a gestão de riscos climáticos em todos os domínios de trabalho.
Para a FAO, a agenda também se apoia nos muitos compromissos internacionais em relação ao clima e depende fortemente de maior financiamento das ações, de modo que existe uma abertura para uma abordagem mais integrada e coerente entre as Convenções do Rio, no contexto da preservação da natureza, ação climática e segurança alimentar. Assim, agora seria o momento de advogar juntos pelas soluções dentro dos sistemas agroalimentares que possam simultaneamente abordar os desafios ambientais, de biodiversidade, climáticos e da segurança alimentar e nutricional (Food and Agriculture Organization (FAO), 2024).
Esse conjunto de ações reforça os posicionamentos da FAO durante a COP 28, considerando a necessidade de reduzir as emissões de gases de efeito estufa da pecuária, a restauração de ecossistemas de montanha e novos financiamentos e parcerias para a ação climática, como fundos globais que enfrentem conjuntamente as mudanças climáticas, a perda da biodiversidade e a insegurança alimentar e nutricional (Food and Agriculture Organization (FAO), 2023).
Por fim, ainda em março de 2024, no relatório apresentado na 55ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos, a Alta Comissária Adjunta de Direitos Humanos, Nada Al Nashif, fez um importante alerta sobre as ameaças das mudanças climáticas e o direito humano à alimentação. No relatório, houve um alerta sobre o atual paradigma econômico, que, nas palavras da Alta Comissária, cria um “ciclo vicioso” em que os impactos climáticos aprofundam a insegurança alimentar, enquanto a “dependência excessiva dos sistemas alimentares industriais agrava as alterações climáticas e a vulnerabilidade das comunidades”. Além disso, a Alta Comissária, lamentou que, apesar do compromisso mundial de criar um mundo livre da fome até 2030, cerca de 783 milhões de pessoas, mais de 9% da população mundial, sofreram de fome crônica no ano passado (Office of the High Commissioner for Human Rights, 2024).
Segundo o relatório apresentado, seriam necessárias cinco ações para impedir os danos relacionados às mudanças climáticas na alimentação no mundo (United Nations High Commissioner for Human Rights, 2024):
– Evitar que a produção agrícola industrial fomente ainda mais as alterações climáticas;
– Implementar reforma agrária e proteção social universal (os Estados precisam reconhecer os direitos dos povos indígenas, dos camponeses e das pessoas em situação de pobreza e vulnerabilidade);
– Garantir que as empresas atuem de forma responsável para enfrentar as mudanças climáticas e seu impacto no direito à alimentação;
– Abrir o espaço fiscal para mobilizar o financiamento necessário para a implementação das políticas públicas; e
– Fortalecer a transição para sistemas alimentares sustentáveis, como apoio a alternativas como a agroecologia para tornar os sistemas de produção de alimentos mais resilientes.
Água e os sistemas alimentares
Vale destacar por fim, o Dia Mundial da Água, celebrado em 22 de março, tendo em vista que a água é essencial à vida, como alimento e como insumo para a produção de alimentos, que precisa ser manejada racional e sustentavelmente e que precisa ser defendida com um direito humano básico que representa (FAO, 2023). No contexto das mudanças climáticas, frequentemente as secas agravam a insegurança alimentar e nutricional e colocam em maior risco as populações vulneráveis.
Essa questão foi detalhada, em 2015, o Painel de Alto Nível de Especialistas da FAO (HLPE), em seu relatório “Água para a Segurança Alimentar e Nutricional” (Water for food security and nutrition), que aborda da relação direta entre a água e a SAN, do nível domiciliar ao nível global, e os nexos entre água, terras, solos, energia e alimentos, bem como sua influência nos objetivos de crescimento inclusivo e desenvolvimento sustentável num contexto de demandas concorrentes, crescente escassez e mudanças climáticas. O relatório traz formas para o monitoramento aprimorado da água na agricultura e nos sistemas alimentares, bem como formas de melhorar a governança sobre a água para melhor segurança alimentar e nutricional para todos, hoje e no futuro, reforçando o direito humano à água (HPLE, 2015).
A disponibilidade e estabilidade do suprimento de água são centrais para a segurança alimentar e nutricional, considerando as águas das chuvas, das superfícies e do subsolo. Nesse sentido, os ecossistemas sustentam as fontes de água e as florestas têm um papel fundamental no ciclo das águas, porém as mudanças climáticas agregam grande incerteza à disponibilidade de água em muitas regiões, afetando precipitações, escoamento, fluxos hidrológicos, qualidade da água, temperatura da água e reposição das águas subterrâneas. Além disso, as mudanças climáticas afetam as necessidades de água da cultura de plantas e animais, incluindo o impacto da temperatura sobre os peixes.
Uma grande preocupação apontada envolve os usos concorrentes da água, que provocam um crescente estresse por recursos de água em muitas partes do mundo, motivado pelo crescimento populacional e mudanças nos estilos de vida e dietas que aumentam a demanda por água, pressionando as fontes existentes. Isso é mais preocupante na perspectiva global de crescimento da demanda para a irrigação, para a indústria, para a produção de energia e para o uso doméstico, gerando uma maior competição por recursos naturais que estão mais escassos.
É fundamental, ainda, considerar as relações de poder social, político e econômico dentro e entre países, bem como no nível local, que afetam o acesso à água e como a escassez pode decorrer de disputas desiguais afeta mais significativamente a pequenos produtores, mulheres e populações marginalizadas e vulneráveis.
Portanto, é central abordar o desafio da governança da água para a SAN, considerando o embate entre as políticas públicas e os interesses concorrentes no uso da água pelo setor privado e seus atores com diferentes graus de poder político e econômico, que pode aumentar as desigualdades, demandando regras sobre papeis e funções dos atores e sua responsabilização, assim como mecanismos para a participação social. Por isso, a atuação estatal para a garantia desse direito é importante para garantir a integração, coordenação e priorização de políticas intersetoriais, incluindo uma governança participativa e o estímulo ao uso sustentável em todas as atividades e a provisão para as populações mais vulneráveis, conservando os ecossistemas e mantendo a sua biodiversidade.
O impacto ambiental dos ultraprocessados
Vale destacar, por fim, que dentro da abordagem dos sistemas alimentares, frequentemente não é dada a devida abordagem aos produtos ultraprocessados. Considerando as mudanças nos sistemas alimentares contemporâneos, a questão do ultraprocessamento dos alimentos, além de suas consequências nocivas sobre a saúde humana, também está associada a um grande impacto ambiental, tanto no que se refere à pegada de carbono, quanto de água.
Por exemplo, estimativas no Brasil, indicam que a pegada de água de uma dieta predominante em produtos ultraprocessados é 10% maior do que a de dietas baseadas em alimentos in natura e minimamente processados (Garzillo et al., 2022) e que o impacto ambiental da produção e consumo de ultraprocessados tem crescido significativamente ao longo das últimas três décadas (T Da Silva et al., 2021).
Considerando esse modelo produtivo hegemônico e suas práticas pouco sustentáveis e predatórias de produção, há também significativa redução da biodiversidade de plantas comestíveis e de animais de criação, fazendo dos sistemas alimentares uma das principais fontes de gases de efeito estufa e um dos maiores fatores de degradação e poluição dos solos e das águas. Esses sistemas alimentares hegemônicos são associados a 39% do uso de energia, 36% a 45% da perda de biodiversidade, um terço das emissões de gases de efeito estufa, de uso da terra e perdas e desperdícios e aproximadamente um quarto do uso de água relacionado às dietas pelos adultos de países de alta renda e seus impactos têm aumentado também nos países de renda baixa e média (Anastasiou et al., 2022).
Destaques nas políticas nacionais brasileiras
No Brasil, o conjunto de políticas de proteção social aliadas à promoção da produção de alimentos saudáveis, como na retomada do apoio à agricultura familiar, no estímulo à produção orgânica e agroecológica e na expansão das comprar públicas e equipamentos sociais, são exemplos de políticas intersetoriais que atuam para aliar o enfrentamento da insegurança alimentar e nutricional com a ação pelo clima e para a redução de desigualdades.
Merece destaque especial a publicação do Decreto Presidencial sobre a cesta básica de alimentos no âmbito da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional e da Política Nacional de Abastecimento no início de março de 2024 (Governo do Brasil, 2024). Dentre os grandes avanços trazidos com o Decreto presidencial, temos o alinhamento da cesta básica com as recomendações do Guia Alimentar para a População Brasileira, de modo que só poderá conter alimentos in natura e minimamente processados, além de ingredientes culinários e alguns alimentos processados, sendo excluídos todos os produtos ultraprocessados. Essa medida também terá importante impacto no campo da tributação de alimentos, na medida que os produtos da cesta não serão sujeitos a impostos, ampliando a progressividade das políticas públicas e reduzindo as desigualdades de renda, além de dar abertura para a possível tributação seletiva de ultraprocessados devido a seu impacto negativo sobre a saúde humana e sobre o ambiente.
Conclusão
A relação entre as mudanças climáticas e os sistemas alimentares e a segurança alimentar e nutricional é uma questão global cada vez mais relevante, exemplificado pela atual sindemia que reúne a desnutrição, a obesidade e as mudanças climáticas como consequências dos sistemas alimentares hegemônicos (Swinburn et al., 2019). Diante dessas questões, será fundamental reforçar a transformação dos modos de produção e consumo dos alimentos, favorecendo modelos de produção diversificada e sustentável de alimentos frescos e minimamente processados, enquanto se deve retirar a centralidade dos sistemas apoiados em monoculturas de commodities agrícolas e na globalização de padrões alimentares baseados nos produtos alimentícios ultraprocessados.
Contudo, a falta de ação sobre o clima e as ações paliativas que não são capazes de modificar os sistemas alimentares hegemônicos levam à continuidade de um ciclo vicioso de mudanças climáticas afetando a produção de alimentos e aumentando o risco de insegurança alimentar e nutricional enquanto os modos insustentáveis de produção de alimentos continuam a aumentar as desigualdades e a fome e a retroalimentar ainda mais as mudanças climáticas. Os compromissos globais, nacionais e locais precisam, portanto, ir além do discurso de transformação dos sistemas alimentares para que transformá-lo em prática, fomentando sistemas alimentares saudáveis, sustentáveis, inclusivos e resilientes que quebrem esse ciclo.
Referências
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